segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Infância perdida, muito bem vivida

Ganhei o meu primeiro videogame quando eu tinha uns 5 anos. Foi o passaporte pra infância perdida, ou ganhada, dependendo do ponto de vista.

Eu morava num prédio onde os moradores não podiam usar a garagem pra nada senão pra estacionar os veículos. Fato esse, que, impedia os moradores júnior do prédio - meu caso na época - de brincar de qualquer coisa.

Mais ou menos na mesma época, eu ganhei uma bicicleta, daquelas que vinham com rodinhas do lado. Como já disse, não podia brincar na garagem, então era difícil. Além disso, o prédio ficava numa ladeira cujo final se juntava com uma saída da rodovia Castelo Branco. Ou seja, descer a ladeira de bicicleta não era uma boa idéia.

Meu pai sempre trabalhou muito durante as semanas - nunca o vi em férias - e ele costumava usar os domingos pra descansar em casa. Minha mãe não dirigia na época. Portanto, não era todo domingo que eu podia andar de bicicleta na Cidade Universitária (aberta a todo o povo na época) com meu pai, sendo que ainda não existia Parque Villa-Lobos e meu pai, até onde eu sei, não sabia andar de bicicleta. Então, a idéia de andar de bicicleta no corredor do nosso apartamento não era lá muito boa e meu pai acabou por vender as mesmas.

Enquanto isso, eu ganhava mais e mais jogos de videogame, ficava melhor neles e esquecia da idéia de andar de bicicleta. Até que, aos sete anos de idade, aconteceu o desastre: meus pais compraram um computador. De vez em quando eu até jogava bola no corredor com meu irmão, mas o maldito aparelho reinava soberano, era motivo-mor de disputas entre nós.

Em alguns domingos, íamos a casa de meus tios-avós e eu, é claro, ficava no computador da minha prima. Minha mãe ficava com a minha bisavó, já bem velha, bem doente, a qual eu sempre chamei de "vó". Ela veio a falecer quando eu tinha meus oito anos. Foi a única "vó" que eu conheci.

Não tive histórias de vô e vó, não sei andar de bicicleta, nunca empinei pipa e nunca joguei futebol na rua de casa.

Tive computador e videogame. Pai e mãe. Alguns poucos amigos que iam em casa pra jogar. Tive irmão.

Mas enfim, agora sim, hora de adquirir o ponto de vista.

O que é uma infância perdida? O que é uma infância bem aproveitada?

A infância perdida é aquela que não foi vivida, que não existiu. A infância bem aproveitada é aquela que existiu e você pode contá-la.

Sinto pena por não ter conhecido meus avós, mas não me esqueço do resto da minha infância, muito bem vivida.

ps.: Texto escrito no celular numa tarde ensolarada num domingo, em que eu, sentado no Parque Villa-Lobos, via as pessoas andarem de patins e bicicleta pra lá e pra cá, enquanto eu ficava apenas sentado.

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